"Nada torna, nada se repete, porque tudo é real."
*Alberto Caeiro

sexta-feira, novembro 30, 2007

Porque as biografias só têm duas datas: a do nascimento e a da morte

Dia que assinala a morte de Fernando Pessoa. O poeta que fingiu ser um fingidor. De cujo fantasma se diz que anda pelos corredores e escadas da sua casa, em Campo de Ourique. O homem que foi vários. Que escreveu em vida o seu próprio epitáfio.

De que morte é feita a palavra? Folheio-te, Fernando. Sacio a fome dos olhos e a sede da boca, a aspereza das mãos, o desequilibrio do corpo, com os teus múltiplos orgasmos de fingimento. Foste-te a 30 de novembro de 1935, mas ainda te vejo, como na história que nos contaram, de pé, caneta enlaçada nos dedos, copo pousado ao lado do papel, a escrever uma ode qualquer pós-moderna.





Basta Pensar em Sentir

Basta pensar em sentir
Para sentir em pensar.
Meu coração faz sorrir
Meu coração a chorar.
Depois de parar de andar,
Depois de ficar e ir,
Hei de ser quem vai chegar
Para ser quem quer partir.
Viver é não conseguir.

F.Pessoa
Eu que venero aquelas mãozinhas habilidosas que conseguem pegar num trapinho velho e transformá-lo em qualquer coisa bonita e útil, ou que conseguem ter imaginação suficiente para fazerem as próprias prendas que oferecem no Natal ou nos aniversários...Eu que não tenho jeito para nada disso acabei por entrar num jogo, quando respondi no blogue da catrela ao post pay it forward. Ou seja, meti-me onde não devia ;-)Bem, mas agora não posso faltar ao compromisso. Por isso cá vai:

As três primeiras pessoas que se mostrarem interessadas em participar neste jogo receberão um presente feito por mim mesma. Não faço ideia o que possa ser. Ainda.

Querendo arriscar, só terão que fazer a mesmíssima "promessa" no vosso blogue. Se quebrarem a corrente não se preocupem, não vos acontecerá nada, nem 7 anos de azar, nem penitência a cumprir.

Boa sorte!
Os cadernos de Malte de Laurids Brigge, romance de Rainer Maria Rilke, foi-me dado a conhecer e a ler neste último verão. Agosto trazia-me quase diariamente um apontamento escrito das páginas deste livro. Eu já esperava ansiosa que um novo parágrafo se me revelasse,por mail, junto com os cereais do pequeno-almoço. (Ou isso era do outro lado do atlântico?) Setembro chegou e a leitura ficou inacabada.
Hoje saí à rua com pouco dinheiro na carteira, passei pelo alfarrabista do costume e lá estava o livro, numa edição antiga, de 1975 (um ano antes de ter nascido). Na capa, uma manhã de Outono no Cais do Sena. Entrei. Estou fascinada com esta edição. Tenho problemas com o manuseamento de livros usados. Sinto a pele da cara a fervilhar. Apetece-me ir lavar as mãos com alguma frequência. Pergunto-me quem será a Ângela que comprou o livro em 1982. Por que o terá dispensado da sua estante. A minha, também em segunda, ou terceira mão, já curvada pelo peso, ganhou mais um exemplar e ri-se.



Abro ao acaso nesta página já lida:

"Já o disse? aprendo a ver. sim, estou a começar. Ainda é difícil.
Mas pretendo aproveitar o meu tempo.
Nunca tinha tomado consciência, por exemplo, da enorma quantidade de
rostos que há. Existem numerosas pessoas, mas os rostos são ainda
mais, pois cada uma tem vários. Há pessoas que usam um rosto durante
anos a fio e é claro que ele se gasta, se suja, se quebra nas rugas,
se alarga como as luvas que foram usadas em viagem. São pessoas
poupadas, simples; não o mudam, nem sequer o mandam limpar. Ainda
está bom, afirmam, e quem lhes pode provar o contrário? mas então
pode naturalmente perguntar-se: uma vez que têm vários rostos, o que
fazem com os outros? Guardam-no. São para os filhos. Mas também
acontece que os seus cães saem com eles. E porque não? Um rosto é um
rosto..
Outras pessoas colocam os seus rostos com uma rapidez incrível, um
após o outro, e gastam-nos. Primeiro parece-lhes que chegariam para
sempre, mas , mal fazem quarenta anos, o que têm já é o último. Tudo
isto tem, evidentemente, o seu lado trágico. Não estão habituadas a
poupar rostos, o último fica gasto ao fim de oito dias, tem buracos,
em muitos pontos é fino como papel, e então vai aparecendo
gradualmente o que está por baixo, o não-rosto, e é com ele que andam.
Mas aquela mulher, aquela mulher: estava completamente ensimesmada,
de cabeça inclinada para a frente, sobre as mãos. Foi na esquina da
rue Notre-Dame-des-Champs. Assim que a vi comecei a andar sem fazer
ruído. Quando os pobres se põem a pensar não se deve incomodá-los.
Talvez acabem por lembrar-se.(...)"

quinta-feira, novembro 29, 2007

I married myself*

by Sparks

I married myself
I'm very happy together
I married myself
I'm very happy together

I married myself
I'm very happy together
Long, long walks on the beach, lovely times
I married myself, I'm very happy together
Candlelight dinners home, lovely times

This time it's gonna last, this time it's gonna last
Forever, forever, forever

I married myself
I'm very happy together
I married myself
I'm very happy together

This time it's gonna last, this time it's gonna last
Forever, forever, forever
This time it's gonna last, this time it's gonna last
Forever, forever, forever

I married myself
I'm very happy together
Long, long walks on the beach, lovely times
I married myself, I'm very happy together
Candlelight dinners home, lovely times

This time it's gonna last, this time it's gonna last
Forever, forever, forever
This time it's gonna last, this time it's gonna last
Forever, forever, forever



*os 2 últimos post contam com o elevado patrocínio de objecto permanente(música e brinde)
depois de, numa destas noites, ter brindado ao cinismo. depois de histórias da vida banal, contas e mais contas para pagar, notícias de perto e de longe, livros por ler, jornais folheados à pressa ao pequeno-almoço, bons dias e boas tardes a estranhos de rua...depois da canção do sérgio godinho na rádio - descias o douro, fui esperar-te ao tejo -, depois do que se diz, depois do que não se diz, depois do que se ouve... penso, como se pensar fosse apenas mais um gesto banal do dia-a-dia:

eu não sei se o maior cinismo está no gostar de alguém. ou no deixar que alguém goste de nós.

terça-feira, novembro 27, 2007

Trinity Revisited

Há 20 anos atrás, em Novembro de 1987, na Holy Trinity Church, em Toronto, Alan Anton, Margo Timmins, Michael Timmins e Peter Timmins, sob o nome de Cowboy Junkies, gravavam um disco, Trinity Session, que faria história como um dos melhores álbuns de todos os tempos. Um arrepio da primeira à última canção, sendo o seu expoente máximo a faixa 3, blue moon revisited. A voz de Margo é neste álbum ainda mais celestial.
20 anos depois,um duplo cd/dvd marca o regresso do grupo à mesma Igreja de Toronto.Trinity Revisited. Mesmo sem ver, nem ouvir, digo: IMPERDÍVEL!



Seria uma excelente prenda de Natal, ou de anos, como preferirem ;-)
Aqui ficam alguns arrepios.



(tenho que dizer isto. a Margo continua muito bonita!)

sábado, novembro 24, 2007

as cidades têm bandas sonoras. nós somos sempre protagonistas do filme errado. fingimos gostar do nosso par, vivemos de encontros e de desencontros, mas, às vezes, apaixonamo-nos mesmo, como na vida real. neste cenário nada acontece por acaso. nem mesmo a colher de café que cai ao chão. ou o guarda-chuva esquecido no banco de trás de um carro qualquer.como nos filmes, há sempre alguém à procura de alguém. há sempre alguém preso às janelas, de peito rasgado pela vida.como nos filmes, não há curas absolutas para os amores que se julgaram perfeitos.como nos filmes, os olhos mentem.o beijo é arte e fingimento. o corpo não é pertença de ninguém.molda-se.cai.decompõe-se.como nos filmes,há alguém, neste momento, à minha espera.e não vou. não quero correr.não tenho pressa.como nos filmes, não há relógios.e a verdade é que o despertador não tocou.

mas, sabes, a lua estava perfeita ontem à noite. como nos filmes.

sexta-feira, novembro 23, 2007

até o caracol tem tosse!

que é como quem diz: o meu maninho querido, o meu petit prince, que ainda ontem (ou quase) usava fraldas já está aí pronto para as curvas. parabéns!


Elina Brotherus

trago as mãos sonâmbulas de te esperar ao relento na noite.
há muito que deixei de trazer mapas nos bolsos.
respiro apenas a lonjura.
esse país onde habitamos há demasiados séculos.
à deriva, o corpo.
nem a voz se comove já num abraço.

quinta-feira, novembro 22, 2007

cat's life






o josé a dormir com a carla bruni


a teresa a imitar a pose da Cristina Branco



o simão e o elogio ao amor


dizia eu hoje que os meus gatos eram um alvo fotográfico fácil. mas a verdade é que há razões para os fotografar (quase) diariamente. difícil é resistir ao impulso e não captar os seus pequenos momentos, uns com os outros, sozinhos, ou comigo.

quarta-feira, novembro 21, 2007

diriam de nós


©ana pereira


diriam de nós que seríamos felizes para sempre.
isso dizem como se fosse segredo. mas
por vezes apetece ceder ao rumor
incessante do mar, a essas vozes,
ao que fica momentaneamente suspenso do fio
das roseiras.

diriam de nós, ao verem-nos adormecer, que estamos
felizes para sempre. mas quase não se vê essa luz intensa
nem os instante que demorámos, eu e tu, e assim pela
primeira vez te chamo meu amor, a trocar os dedos
entre nós. a água volta à água no seu movimento inicial,
o inverno vai regressar, isso dizem também olhando
o que de outro modo olhámos.
diriam que seremos felizes para sempre, enquanto
dizem.

Francisco José Viegas, todas as coisas



©ana pereira
é mesmo verdade que se consegue passar no intervalo da chuva.

chove outra vez.

terça-feira, novembro 20, 2007

o que hoje é não tem fotografia. não há lente capaz de captar o que este dia me trouxe. no entanto, quando percorria o caminho de regresso ao porto, o final do dia reflectia-se em formas e luzes tão bonitas no céu que me apeteceu um gesto, um clique, uma imagem. o retrovisor guardou na memória. eu também. os retrovisores têm sorte. estão sempre voltados para o horizonte. e não funcionam a pilhas.

segunda-feira, novembro 19, 2007

De lisboa

as minha iluminações de natal preferidas:

a ponte 25 de Abril
os candeeiros da cidade avistados do miradouro da Graça
o combóio a atravessar a 24 de Julho
os pontos de luz ao longo do rio
as janelas iluminadas nos bairros antigos
o Castelo no topo de uma das sete colinas
as poças de água onde a lua se reflecte
os aviões a sobrevoarem a segunda circular
as velas acesas no bar onde se pousam conversas em atraso
os sorrisos de quem sente a vida começar

os teus olhinhos a abrirem lentamente



©ana (arquivos)


tudo o resto é folclore e dispenso.

There is no cure...for pain



3/8/2008
Show Lisbon, PO Portugal / Pavilhao Atlantico
TICKETS ON SALE Fri 28th Sept
Call Center: 351 707234234
ticket line


Robert Smith e restantes elementos, em Março, em Lisboa, para apresentação de um duplo álbum que só será lançado na primavera. Isto é o que a Blitz on line anunciava mas tendo em conta que a Primavera começa oficialmente depois da data do concerto... Bem, pormenores.

bilhetes entre 28 e 40 euros. já à venda.



Tal como os Joy Division, esta é uma banda inglesa do período pós-punk. Formada em 1976, tem como vocalista Robert Smith, único elemento que integra o grupo desde a sua formação.

Para audição destaco Pornography (1982) e Desintegration (1989).

Uma banda que tem tantos anos quanto eu, que gosta de ambientes melódicos que são um bom exemplo de como a tristeza pode ser muito bela.


Plainsong




'I think it's dark and it looks like rain'
You said
'And the wind is blowing like it's the end of the world'
You said
'And it's so cold
It's like the cold if you were dead'
And then you smiled
For a second

'I think I'm old and I'm feeling pain'
You said
'And it's all running out like it's the end of the world'
You said
'And it's so cold it's like the cold if you were dead'
And then you smiled
For a second

Sometimes you make me feel
Like I'm living at the edge of the world
Like I'm living at the edge of the world
'It's just the way I smile'
You said
deste lado de cá. a p r o x i m a - t e. quero começar uma história. quero começá-la, assim, como todas as histórias.

era uma vez.

domingo, novembro 18, 2007

loosing my religion

regresso ao cine-teatro do Monumental

ao Luis A.,

Sobre o filme Control, de Anton Corbijn, sobre a vida de Ian Curtis, vocalista dos Joy Division, muito se vai escrever e falar nos próximos tempos. O meu contributo para esse "falatório" será modesto. Tinha 4 anos e alguns meses quando Ian Curtis se suicidou. Da história do grupo, até há dias atrás, pouco conhecia. A sua música também tardiamente me chegou aos poros. Isto é um facto. Outro facto é que, a partir do momento em que os Joy Division deixaram de ser completamente desconhecidos para mim, as capas dos seus discos, as letras das canções, o olhar soturno de Ian Curtis, a turbulência da sua música...tiveram os seus efeitos colaterais... Se os Joy Division não são uma das minhas bandas de culto isso deve-se simplesmente, não à sua descoberta tardia, mas, simplesmente, à minha eterna máxima de que sei, posso e quero viver sem ídolos.
Continuo a dizer pouco. Não posso escrever no mesmo tom que um verdadeiro fã dos Joy Division, mas também não consigo ser indiferente a este fenómeno. As canções dos Joy Division são um marco importante na minha história recente. Exorcizei já muitos fantasmas ao som das suas músicas...alguns dos meus amigos encontro-os aí, lá dentro, na forma como Curtis moldava o corpo à música, na sua obscuridade desconcertante, no desacerto das letras que escrevia.



Eu gostei deste filme. Da forma como o preto e o branco exacerbam as expressões sempre para além do vulgar de Ian Curtis, contextualizadas numa Inglaterra de ambiente socio-económico e cultural subdesenvolvido. Um Ian Curtis, que como todos os líderes míticos, possuía uma capacidade auto-reflexiva acima daquela que caracterizava quem o rodeava, nomeadamente a própria Deborah Curtis, que se auto-retrata no filme. Neste ponto, interrogo-me se terá havido aqui uma espécie de reconhecimento de que Annik Honoré teria uma personalidade e background cultural muito mais capazes de encaixar a soturnidade do espírito do vocalista dos Joy Division. Não interessa. Não quero ir por aí.



Miguel Esteves Cardoso na sua nota sobre o filme, publicada na Actual do Expresso, diz acreditar "que seja melhor sentir e gostar pouco da música dos Joy Division para poder ver este filme como o filme que, se calhar, é", querendo com isto rematar as razões pelas quais não consegue ver Control como um filme.



Sobre Ian Curtis refere que "era um grande cantor porque era capaz de encontrar a verdade dentro dele e cantá-la. Era incapaz de fugir dela; não conseguia cantar a fingir. Muitos bons e maus cantores dão tudo o que têm. O que fazia Ian Curtis é muito mais raro. Dava tudo o que tinha - e era."

Diz mais ainda: " A arte é mentirosa, e ai do artista incapaz de mentir. Foi essa a tragédia de Ian Curtis. Narrar essa incapacidade é um dos méritos do filme de Anton Corbijn."

(...)Isolation, Isolation, Isolation

Mother, I tried, please believe me
I'm doing the best that I can
I'm ashamed of the things I've been put through
I'm ashamed of the person I am

Isolation, Isolation, Isolation
(...)


MEC faz todo o sentido quando escreve: "A mania da verdade de Ian Curtis era uma loucura. A exposição emocional que alcançavam as interpretações dele, tornando-as avassaladoras, vem do mesmo excesso moral, da mesma falta de fronteiras entre a alma e o comportamento; entre a introspecção e a sua exibição compulsiva, como entrega e como punição."



Apeteceu-me, por diversas vezes, no decorrer do filme, juntar-me a Ian Curtis, ou melhor a Sam Riley, no palco, e electrizar os membros do corpo ao som desconcertante da música de Curtis, Hook, Morris e Sumner.

E termino como no filme, ao mesmo tempo que me abandono na escura sala de cinema, com uma tela gigante à frente, à espera de um pouco mais para além do fim.

Walk in silence,
Don’t walk away, in silence.
See the danger,
Always danger,
Endless talking,
Life rebuilding,
Don’t walk away.

Walk in silence,
Don’t turn away, in silence.
Your confusion,
My illusion,
Worn like a mask of self-hate,
Confronts and then dies.
Don’t walk away.

People like you find it easy,
Naked to see,
Walking on air.
Hunting by the rivers,
Through the streets,
Every corner abandoned too soon,
Set down with due care.
Don’t walk away in silence,
Don’t walk away.

sábado, novembro 17, 2007

songs for someone

Perry Blake=Espinho=Janeiro

Notícia da Radar confirmada pela Blitz:

"O irlandês Perry Blake actua em Portugal no próximo mês de Janeiro, pode a BLITZ adiantar.
O concerto está marcado para o Auditório de Espinho e deve servir de apresentação ao mais recente Canyon Songs .
Os bilhetes para o espectáculo, que acontece a 25 de Janeiro, custam 10 euros."





Do we only fall in love
In lovesongs
Do we only fall in love
In song


site oficial
o pior de lisboa: o trânsito infernal.

o melhor do pior de lisboa:
poder sintonizar a Radar, fechar os vidros, ligar a solfagem e ficar a insultar os condutores espertos da metrópole.

há uns dias atrás

alguém uivava noite fora:

olha que há cães mais bonitos que alguns Homens.

sexta-feira, novembro 16, 2007

deixei os gatos abandonados à velha telefonia sintonizada na lua.


e descobri que estou com saudades de vidas assim. de gente assim.



©ana

quinta-feira, novembro 15, 2007

novembro.fim de dia. saio à rua para encontrar os mesmos estranhos pela segunda vez.

Teresa Sá


Doces braços abandonam o teu cansaço,
o casaco na cadeira, faz calor lá onde vais, não precisas dele.

Vendes a casa se chegares e eu já não estiver,
vendes a casa e vais para onde eu não esteja e a lonjura
dessa ausência me traga imensamente mais perto.

Procuras onde eu possa sentir saudades do teu suor de ténues despertares
despes-te sem que eu tenha pressa de correr as persianas.

Queres águas onde caia a lua,
um incidente.

E dizes: vendo a casa se chegar e cá não estiveres,
vendo a casa e vou para onde eu não esteja e a lonjura
dessa ausência me traga imensamente mais perto.

Digo-te adeus do cimo das escadas, os gatos adormecem nos degraus
e o sol não tarda.
No casaco, na cadeira, a impressão ainda de respirares.

Apetece-me a primavera contigo.


Andreia C. Faria

(porque escreves tão bem hoje apeteceu-me "roubar-te" este poema de casa. e acho que vou passar a fazê-lo mais vezes, daqui em diante.)

quarta-feira, novembro 14, 2007


ana

somos carne e sangue e ossos e os cabelos todos
incontáveis
e a pele das mãos e dos pés e do resto do corpo
o sangue os olhos e a boca
a terra mordida esgravatada entranhada
e o sorriso
as mãos os dedos e a ternura
o teu segredo
retrato velho esquecido
o teu sorriso
frio das gavetas
e as mãos e os olhos
e as raízes
e o chão
o chão que há-de comer tudo
tudo
até ao fim
até nada
para além do nada
haver

somos carne e sangue e ossos e
somos começo
antes de qualquer fim
somos começo

manos telepatia. um dia depois porque fui adiando.

terça-feira, novembro 13, 2007

V=RI
P=VI
W=-Fel
F=ma

??????????

mas percebo perfeitamente por que é que um piano pode ser um dia de chuva
talvez um dia regresses e resistas à exaustão
da viagem fechando-te na cúpula silenciosa
de quem assiste ao mover do seu próprio sangue

talvez entres num autocarro e graves nas janelas
as paisagens, outros lugares ainda certos
roteiros de cidades incendiadas
pontes ruindo sobre os rios o fim de tarde

isabel coelho dos santos, o tempo mais puro, cosmorama


lisboa, paulo pimenta

sábado, novembro 10, 2007

A vida real

Se existisses, serias tu,
talvez um pouco menos exacta,
mas a mesma existência, o mesmo nome, a mesma morada.

Atrás de ti haveria
as mesmas duas palmeiras, e eu estaria
sentado a teu lado como numa fotografia.

Entretanto dobrar-se-ia o mundo
(o teu mundo: o teu destino, a tua idade)
entre ser e possibilidade,

e eu permaneceria acordado
e em prosa, habitando-te como uma casa
ou uma memória.


Manuel António Pina


Cig Harvey

sexta-feira, novembro 09, 2007

José, Simão e Teresa




conclusão: adaptação em curso e há vidros a precisarem de ser limpos lá por casa...

quinta-feira, novembro 08, 2007

marcada por ti. a página. um poema. terminava assim:


não olhes à volta.
ata os sapatos.

ingeborg bachman


olhei à volta. não trazia sapatos. porém, os dedos em nós.

mar-i-ana

ainda ontem te senti em movimentos no avesso do corpo. hoje dizem-me que esta mão, que de ti apenas sabe o nome, vai poder tocar-te, em breve, muito em breve,deste lado de cá. não consigo imaginar como será respirar o mesmo ar que tu. e dizem as línguas do mundo que serei tia.

não te apresses. não te distraias. sai para fora mas não deixes de te sentir dentro.


josé.
com este nome tinha que ter lugar na família.
há quem me pergunte:
vais ficar por aqui, não?

estranha forma a minha de (me) negar o instinto materno.

quarta-feira, novembro 07, 2007

este verão demorado em redor das casas
a anoitecer-nos cedo no regaço
os olhos pendurados até à timidez das folhas
esta e aquela árvore e a outra
a adivinharem a lentidão do inverno
a inflexibilidade dos braços
com sede de chuva

havia uma história
conhecia-lhe o fim

o bater veloz de um coração

a arritmia das palavras

a tua fotografia de criança
pousada no móvel antigo da avó
o teu sorriso
de quem ainda arregala os olhos
aos sonhos

era uma vez

mas o sino da aldeia tocou
e a terra prendeu-me as raízes
no seu ventre seco

terça-feira, novembro 06, 2007

silêncio

Não interrogues. E não digas
também
segredos ao ouvido.
O próprio silêncio
é às vezes indiscreto.

Albano Martins, escrito a vermelho


Joana Linda, série: O segredo



taquicardia. coração em excesso de velocidade. travagem brusca. sinal vermelho. ponto morto.

sexta-feira, novembro 02, 2007

andamos aqui todos emprestados, até um dia.
acredita nisto alguém que gosta de ser como uma gaivota e o diz levantando os braços em gesto de vôo.

eu, se me perguntassem, não saberia explicar tão bem a morte.

quinta-feira, novembro 01, 2007


©Seth Dickerman

Rufus Wainwright vai perguntar muito no dia 6 de novembro, em lisboa. Desde:tell me, do you really think you go to hell for having loved? a do i disappoint you in just being human?. E dirá, às tantas, no seu tom de menino mimado a fazer pose de vítima I'm not ready to love.
Estarei lá, na esperança de que me canta o "Oh, What a World" com vestígios de bolero de Ravel.
o ângulo seria perfeito
não fora a tua ausência
como uma ferida no tecto da casa


Cig Harvey

e as mãos em busca de outras linhas

já tarde

sintoma de stress

a minha pergunta preferida: QUE HORAS SÃO?
esta noite consegui reunir à minha frente dois estereotipos: o tipo engravatado a fumar charuto e o homem do talho, sem um dente da frente, a fumar os seus eternos palmall vermelhos.

Ontem foi:

About me:

A minha foto
a entropia é a minha religião. alterno a leitura da bíblia com a interpretação de mapas e mãos. bebo, preferencialmente, azul. tenho, ainda, o hábito de escrever cartas_

Sopra-me ao ouvido: